Por Tacyra Valois
Defendemos que a solução para os desafios atuais do nosso sistema de saúde requer firmar um Pacto de Sustentabilidade para promover transformações através de uma gestão profissionalizada. As lideranças devem utilizar dados e análises em tempo real para uma tomada de decisão mais assertiva, utilizando também ferramentas de Governança Clínica complementar à governança coorporativa, conceitos de ESG, atitudes e posicionamento Compliance, uso inteligente e responsável dos recursos da saúde. Defendemos também que é urgente encontrar um meio termo entre os interesses de mercado e os princípios do SUS (Participativo/Inclusivo). Ambos hoje, setor público e setor privado, não estão conseguindo entregar pelo esgotamento do Modelo-ineficiente, judicializado, “politizado” e heterogêneo na gestão.
A jornada de mudanças precisa estar pautada em indicadores de sustentabilidade do sistema de saúde brasileiro. Como medida urgente, incluímos um novo modelo de assistência no qual inclua explorar a saúde digital como ferramenta não somente para ampliar acesso, mas também para profissionalizar a gestão; ao tempo que precisamos enfrentar definitivamente os desperdícios e o modelo de remuneração e incentivos, uma agenda que é um consenso entre notáveis estudiosos.
Uma agenda com objetivo não somente de ampliar o investimento, mas, agir urgente sobre a revisão do Custo Brasil num compromisso que inclui, mas não se resume, as taxações e impostos como impactante e decisivo custo oculto que pressiona a operação do ecossistema da saúde. Consideramos também uma proposta para aperfeiçoar a utilização dos impostos pagos pelos brasileiros. Hoje, ao fechar a conta, a nação paga duas vezes pelo “direito” ao acesso à saúde: uma por meio do pagamento dos impostos e a segunda quando “faz a opção” pelo pagamento de um plano de saúde para garantir a segurança das suas famílias e/ou dos seus funcionários. Nessa lógica, a cada reajuste anual, precisa optar por reduzir o padrão dos planos contratados para conseguir equacionar a conta necessidade x custo.
Pensando no Pacto de Sustentabilidade como saída para os entraves do setor, as partes interessadas devem se despir das ideologias e certezas intransponíveis que carregam para fortalecer os laços de confiança, transparência e cooperação entre setor público e privado e decisões legislativas e regulatórias. Dessa forma, podem garantir acesso à saúde de qualidade para todos os brasileiros e consolidar definitivamente o nosso sistema nacional de saúde.
É consenso que o sistema de saúde atual não entrega para a sociedade o que ela necessita. Mas, como está o desenvolvimento das reformas estruturantes que o sistema de saúde precisa para ser mais sustentável, acessível e integrado? Estamos criando um modelo que introduza governança, eficiência e promova a governança centrada na necessidade do usuário e nos desafios contemporâneos no mundo pós-pandemia? Como o sistema sustentará o incremento de custos para se manter em funcionamento?
O mundo está saindo da maior crise sanitária da história recente da humanidade. Sistemas de saúde de todos os países foram colocados à prova e, no Brasil, a capacidade de resposta do SUS frente aos inúmeros problemas que surgiram no enfrentamento à pandemia evidenciou a importância de ações planejadas, integradas e o impacto que as decisões governamentais, das três esferas de governo, reflete no dia a dia das pessoas.
Não é novidade que o sistema de saúde brasileiro vive uma grande crise de sustentabilidade. De um lado, o subfinanciamento da saúde pública, de outro, uma baixa remuneração pela prestação de serviços privados, somada a uma alta carga tributária com reflexos econômicos inimagináveis. Para os planos de saúde não é diferente: em 2022, registraram um prejuízo operacional de R$ 10,7 bilhões, segundo a ANS, ao tempo que lideram as reclamações de consumidores segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Assistimos a um setor da saúde privada que não cresce e não consegue ter definido o seu real papel e limites no sistema nacional de saúde. E segue sem fazer as reformas estruturantes necessárias. Suportar esta crise econômica e de confiança no setor, exige novos modelos de enfrentamento, e podemos nos inspirar no que já existe em outros setores, a exemplo de uma Câmara de Negociação.
E não para por aí, o sistema também suporta um número excessivo de decisões judiciais e determinações legislativas que influenciam diretamente nos custos da saúde. Infelizmente, não há uma visão sistêmica e não há uma pré-avaliação dos impactos dessas medidas legislativas e judiciais no funcionamento e na sustentabilidade.
Com o objetivo de minimizar a judicialização, algumas iniciativas estão sendo adotadas no país. Um bom exemplo que começou em Brasília e já se estende para outras localidades são as Câmaras de Mediação em Saúde, que atuam extrajudicialmente com o apoio da Defensoria Pública e objetivam propor solução para o impasse antes do ingresso da ação judicial. No Rio de Janeiro, por exemplo, a Câmara de Resolução de Litígios de Saúde (CRLS), uma iniciativa da Procuradoria Geral do Estado (PGE-RJ) em parceria com as Defensorias Públicas do Estado e da União e as secretarias estadual e municipal de Saúde, registrou um índice de 68% de resolução administrativa extrajudicial dos casos em 2019.
No Legislativo, destacamos dez tramitações que avançam na Câmara dos Deputados e tendem a se manter na pauta:
· Reforma tributária;
· Alterações na regulamentação dos planos de saúde;
· Saúde digital, prontuário eletrônico, integração de dados no SUS;
· Pesquisas clínicas;
· Regulamentação da venda de medicamentos em supermercados;
· Realização de testes laboratoriais em farmácias;
· Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no SUS;
· Regulamentação do uso e plantio medicinal do Cannabis;
· Regulamentação dos cigarros eletrônicos;
· Pisos salariais.
A discussão destas reformas não pode ser de forma dogmática, deve visar a construção de uma jornada de mudanças realmente estruturantes. Todos os elos que compõem a cadeia produtiva e econômica da saúde, estão insatisfeitos e clamam por mudanças que levem a um sistema mais justo, acessível, integrado, perene e sustentável.
O Propósito do Colégio Brasileiro de Executivos em Saúde (CBEXs) é impulsionar estas mudanças no sistema de saúde através da formação de liderança com novo modelo mental nestas agendas transformacionais, e com capacidade de diálogo com as diferentes partes interessadas. Executivos em saúde comprometidos com a vida humana, com a ciência, com a qualidade da assistência, com políticas para maior acesso da população, com o uso racional dos recursos para a saúde. O papel do CBEXs na formação deste novo gestor de saúde é fomentar uma nova cultura para que as tomadas de decisão sejam baseadas em ações responsáveis e pautadas em compromissos e entregas sustentáveis e perenes para o setor da saúde, seja público ou privado.
Tacyra Valois é CEO do CBEXs – Colégio Brasileiro dos Executivos em Saúde
* A opinião manifestada é de responsabilidade da autora e não é, necessariamente, a opinião do IES