Por Eduardo Winston Silva
Alguns planos de saúde estabelecem a modalidade de reembolso. Esta modalidade permite que o beneficiário utilize o serviço de sua confiança/conveniência, ainda que este serviço não figure dentre aqueles com os quais a operadora tem contrato. Ou seja, é um mecanismo que confere “liberdade” ao usuário.
Nesta esteira, são definidos valores limite para reembolsos destes serviços. O beneficiário tem a escolha de usar um serviço cujo custo seja maior, contudo, seu reembolso será limitado ao valor contratado entre as partes. Vale salientar que os planos oferecem serviços similares, sem custo para o beneficiário (ou com coparticipação, dependendo da modalidade).
Porém, como diria Victor Hugo: “tudo que aumenta a liberdade, aumenta a responsabilidade”. Seja por falta de consciência ou puro oportunismo, na prática, infelizmente, o que vemos pelas recentes denúncias é um abuso irresponsável desta liberdade. Vejamos:
– O prestador pergunta o valor do reembolso para determinar o preço do serviço;
– O prestador divide o valor do serviço (principalmente consultas) em dois ou mais recibos (datados com meses diferentes), de forma que o beneficiário possa receber “reembolso integral”;
E existem outras tantas fraudes neste segmento:
– Uso indevido do cartão de usuário – empréstimo ou venda da carteirinha, de modo que pessoas oficialmente não cadastradas acessem os serviços médicos;
– Super indicação de tratamentos – profissionais de saúde realizam procedimentos desnecessários, ou aumentam a quantidade de produtos a serem usados, visando ganhos financeiros;
– Beneficiários fictícios – prestadores de serviços forjam contas médicas por serviços que não foram realizados;
– Beneficiários temporários – empresas de material médico captam pacientes com necessidades de alta complexidade e com dificuldades financeiras, pagam por seus contratos até que a carência esteja findada, e eles possam passar por procedimentos de alto custo, cancelando os contratos assim que os procedimentos são realizados;
– Informações falsas – usuários falsificam receitas médicas, ou notas fiscais de profissionais de saúde, de modo a receberem reembolsos indevidos, em procedimentos não cobertos pelas operadoras.
Eu questiono:
– Será que isso é feito somente por pessoas de má índole, fraudadores convictos?
– Será que as pessoas têm “consciência” que isso é, ao cabo, uma fraude?
– Será que enxergam que esta prática invariavelmente implicará no futuro: a) redução desta liberdade. b) maior burocracia. c) aumento no custo dos planos para as famílias/empresas?
– Será que o caminho é investigar e prender todos que em algum momento fizeram algo assim?
– Será que a conscientização e sensibilização não seria um caminho mais promissor?
Segundo levantamento da Associação Brasileira de Planos de Saúde, entre 2019 e 2022, o volume de reembolsos de procedimentos médicos saltou 90%, para R$ 11,4 bilhões. Como este aumento é muito superior ao dos procedimentos cobertos pelas operadoras nos mesmos três anos (alta de 19,5%), eles consideram a diferença de R$ 7,4 bi em ressarcimentos fruto de fraudes.
Volto a lembrar: além de ilícitas, tais atitudes são irresponsáveis, deterioram a qualidade e encarecem o acesso a saúde para milhões de brasileiros. Em outras palavras, os envolvidos não estão “levando vantagem sobre as operadoras” – o que já seria reprovável –, mas prejudicando todos os demais beneficiários de planos de saúde com sua “estúpida malandragem”.
É importante que tenhamos a consciência que o Brasil será aquilo que dele fizermos. Vivemos em sociedade, temos direitos, mas também deveres. Não podemos mais nos calar diante de situações fraudulentas. O Instituto Ética Saúde mantém um Canal para receber relatos de más práticas do setor. Sabemos que muitas vezes não há como provar os fatos, mas o simples ato de relatar já nos ajuda a mapear as diversas situações e envolver os setores representados e as autoridades para tentar combater tais prática.
Denuncie em: https://www.canalconfidencial.com.br/canaleticasaude/.
Garantimos seu anonimato.
Eduardo Winston Silva, é economista e presidente do Conselho de Administração do Instituto Ética Saúde
* A opinião manifestada é de responsabilidade do autor e não é, necessariamente, a opinião do IES