Por Eduardo Winston Silva
Em fevereiro de 2023, o litoral norte de São Paulo foi atingido por fortes chuvas, deixando um rastro de mortes e destruição. A tragédia provocou comoção de muitos, que logo formaram redes de ajuda aos atingidos pelos temporais. Em meio ao cenário desolador, gerou forte indignação a informação que alguns comerciantes estariam aproveitando a situação para obter lucros extraordinários. quando o exemplo de garrafas de água sendo vendidas a mais de R$ 90,00 veio à tona.
Reviver tais memórias aqui neste blog tem um propósito: discutir a questão sob outra perspectiva.
Prezamos a liberdade como um dos valores fundamentais. Neste conceito, há uma vertente que chamamos de liberdade econômica. A liberdade de empreender, inovar, negociar seu trabalho e o produto deste de forma livre. Afinal, a alternativa seria o estado centralizador regulando a oferta e os preços de todas as mercadorias. De certa forma, tivemos tais experiências de centralização e os resultados em geral foram ruins. As distorções geradas por tamanha centralização superaram os eventuais benefícios. No Brasil, podemos dizer que o congelamento de preços promovido durante o plano Cruzado foi uma destas experiências e aqueles que viveram tais dias sabem o desfecho: escassez de produtos e uma explosão inflacionária na sequência. Então, se não queremos que o estado determine o preço que pode ser cobrado por uma garrafa de água, mas nos indignamos com atuações oportunistas, como podemos fazer?
Antes de entrar pelas soluções possíveis, vamos trazer a discussão para o setor da saúde. Notoriamente, este é um setor onde as leis de mercado têm limites a sua aplicação. Caso os preços fossem negociados no “balcão”, seguindo somente as leis de mercado:
Quanto pagaria uma mãe por um remédio para seu filho?
Quanto pagaria um infartado por uma intervenção de emergência?
Seria razoável admitir a promoção de um leilão de um medicamento entre pacientes como forma de maximizar seus ganhos?
Não à toa, temos duas agências governamentais (Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA e Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS) dedicadas exclusivamente a questões que afetam o sistema de saúde. Além destas agências, o Ministério da Saúde e mesmo o Sistema Único de Saúde – SUS, de certa forma, também regulam o mercado com a suas atuações. Ocorre que esta regulação, ainda que bem-feita, também gera distorções e jamais cobrirá todas as transações que ocorrem em cada hospital, clínica, consultório, laboratório ou farmácia. Ainda assim, na esperança de tentar reduzir o oportunismo que vemos, seguimos editando normas, regras, códigos de conduta, além de reforçarmos investimentos em mecanismos de controle. Nada parece estar funcionando como gostaríamos.
A solução, assim como na situação da venda da água durante a calamidade, passa pelo desenvolvimento de um forte sentido de ética no segmento. Vale ressaltar que a ética não é um sistema de regras, fiscalização e punição. Ética não é Compliance, mas o freio moral que surge justamente quando os mecanismos formais não alcançam. Parte da consciência que vivemos em sociedade é que, se todos atuarem de forma oportunista, estaremos coletivamente muito piores do que estaríamos se atuássemos com senso de responsabilidade sobre o outro. É uma atuação verdadeiramente patriota na medida que as atitudes pessoais influenciam na situação do país. Representam a responsabilidade social, uma vez que renuncia a ganhos pessoais extraordinários em prol do bem comum.
Certa vez, o executivo Fabio Barbosa trouxe a seguinte reflexão: “É o que fazemos no dia a dia que realmente importa. A caridade é importante, as doações (principalmente em situações de calamidade) são fundamentais! Mas é o que fazemos a cada dia, em nossa ocupação que realmente determina nossa contribuição para a sociedade”. E, na saúde, temos todos condição de fazer a diferença na vida das pessoas e na comunidade que estamos inseridos. Mas temos que incorporar a ética em nossas atuações, definitivamente!
Eduardo Winston Silva é economista, mestre em administração, diretor para o Brasil de empresa multinacional do setor saúde e presidente do Conselho de Administração do Instituto Ética Saúde.
* A opinião manifestada é de responsabilidade do autor e não é, necessariamente, a opinião do IES
Frase perfeita meu amigo:
“Vale ressaltar que a ética não é um sistema de regras, fiscalização e punição. Ética não é Compliance, mas o freio moral que surge justamente quando os mecanismos formais não alcançam.”
Parabéns pela incrível reflexão!